José Antônio de Azevedo é escritor, Auditor-Fiscal aposentado há 25 anos e membro da APAFISP – Associação Paulista dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil. Residente em Ribeirão Preto (SP), conta com três livros à venda nas livrarias Asabeça e Cultura, que têm como ponto central o papel do idoso na sociedade atual. São eles: “Comendo Fogo e Cuspindo Cinzas”, “O Coração Infarta Quando Chega a Ingratidão” e “O Homem no Mundo”.
Caboclo e lavrador rural até 28 anos de idade, Azevedo recomeçou sua vida saindo do analfabetismo. Atuou como boia fria, estudou, formou-se e foi aprovado no concurso público para escriturário no Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (Iapi) até chegar, por meio de concurso, ao que é hoje o cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. Iniciou a vida literária aos 65 anos de idade, mesma idade com que aprendeu a usar o computador. Confira abaixo as sinopses dos livros e, em seguida, a entrevista com o escritor de 80 anos:
Comendo Fogo e Cuspindo Cinzas:
O autor, com observações críticas sobre o tratamento dado às questões envolvendo as pessoas mais velhas, apresenta o jovem caboclo Zé Baiano e o idoso cidadão Maicro, como coadjuvantes. De maneira que, formando uma simbiose, incorporam-se em Ícaro, este sim protagonista, e geram em si energia até chegar à Juventude Acumulada.
Então, o protagonista Ícaro conduz o leitor por uma série de conferências discutindo aspectos da existência, em busca da evolução humana. Reflete o autor sobre a obra: “é preciso energia para não fenecer, assim como é necessário paz para aprender sorrir”.
O Coração Infarta Quando Chega a Ingratidão:
A obra é uma coletânea de crônicas e contos, mirando os temas marcantes do país como: as amarguras dos idosos, as mancomunações políticas, os descasos com as doenças do povo, o Estado Mínimo e a Previdência Social. Dentro de uma ótica irônica, o autor critica o abandono das pessoas idosas, os conchavos políticos, a mercantilização da saúde; a ausência do Estado para governar e a aposentadoria “pé na cova”.
A defesa das pessoas idosas e da Previdência Social do Brasil como foco principal, o autor discorre sobre a evolução natural, observando toda a existência, desde a simplicidade dos caipiras rurais até as complexas elites urbanas; ao começar pela humildade dos caboclos até os intrincados conhecimentos dos cientistas biológicos e físicos nos estudos da lógica humana.
O Homem No Mundo:
Obra que trata de narrativas críticas, objetiva os desmandos da administração pública, acusa a penúria dos idosos, desde o descaso familiar até a inação das autoridades governamentais, e denuncia a política administrativa da Previdência Social. Com estas três asserções, o autor defende a administração pública voltada para o povo, a gratidão de todos para com os idosos e a Previdência Social condizente com os trabalhadores.
O autor analisa e expõe em cada crônica ou conto assuntos diferentes com episódios do dia a dia. A sua experiência de vida, somada à bagagem adquirida em seus estudos e pesquisas resultou no conjunto cultural que lhe permite concluir de forma crítica sobre fatos reais, de abrangência familiar, regional, nacional ou internacional.
ENTREVISTA
APAFISP – suas obras têm uma característica marcante: apresentam a sociedade sob o ponto de vista do idoso. Como você avalia este tipo de literatura no mercado? É um segmento explorado por muitos autores ou editoras?
AZEVEDO – vejo a situação do idoso no Brasil como bastante penalizada, apesar das Leis e do Estatuto do Idoso, onde o legislador, o cumpridor das Leis e conciliador (Legislativo, Executivo e Judiciário), que deveriam defendê-lo, fazem o contrário. A família também, por consanguinidade e afeto, pouca proteção dá ao seu idoso, principalmente se ele tiver limitações físicas ou mentais. Não dispensam o devido tratamento com carinho, compreensão e paciência devidos, principalmente pelos netos e bisnetos adolescentes. A sociedade, dentre os dois grupos, é a que compreende melhor o idoso, talvez por estar menos presente na vida dele e com menor obrigação de defendê-lo.
APAFISP – como você vê as exceções a este tipo de tratamento?
AZEVEDO – elas existem, mas em menor escala. O tema não é de grande interesse mercadológico, mas posso considerar como um São João Batista, personagem bíblico, que pregava no deserto. Meu objetivo é para que estes segmentos sociais, essencialmente os jovens, preparem o futuro para não dependerem tanto de ninguém.
APAFISP – Em relação ao tratamento dado pela sociedade ao idoso desde que o senhor se aposentou. Quais as mudanças mais significativas, as conquistas e derrotas neste período?
AZEVEDO – Classifico que a minha geração foi a que mais sofreu com as transformações socioeconômicas em todo o tempo. De 1935 a 2015, o mundo passou por uma transição maior que até então, e esta geração teve que suportar todas as mudanças. A sequência de transformações após a aposentadoria teve a mesma gradação de antes. A inatividade profissional só me deu a oportunidade de realizar um sonho antigo: escrever para expor as minhas ideias. Tive derrotas em algumas lutas, mas venci a guerra da vida; entretanto, a minha condição de escritor é uma grande realização.
APAFISP – O senhor teve uma infância em ambiente rural, onde, sabidamente, o acesso ao ensino não é amplo, como pode ser considerado atualmente. Como os estudos transformaram sua vida? Alguém em especial te ajudou?
AZEVEDO – Na zona rural trabalhei na roça para os meus pais em regime de economia familiar, como era de costume, em um conjunto de famílias de nove clãs. Mudei para a cidade grande com os meus pais, esposa, um filho e outro em gestação, sem eira nem beira, aos 23 anos de idade. Em Ribeirão Preto, recomecei minha vida como boia fria, trabalhando de dia, como cortador de cana, de segunda-feira a domingo sem descanso; estudando à noite e dormindo cinco horas por noite. Ao alcançar o curso ginasial, prestei concurso para escriturário do Iapi e passei. Depois, eu me formei em Administração, prestei e passei em outro concurso, o de fiscal de Contribuições Previdenciárias – atualmente Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil –, cargo este que me deu condições para tirar as minhas primeiras férias na vida. A única ajuda que tive foi a da esposa como lavadeira de roupa.